domingo, 23 de janeiro de 2011

Cidades do interior são alvos fáceis

adriano abreuOs coletes estão vencidos. Comprados em 2000 eles devem ter cinco anos de uso - mas já têm 10Os coletes estão vencidos. Comprados em 2000 eles devem ter cinco anos de uso - mas já têm 10
 
Colete balístico com prazo de validade expirado, armamento ultrapassado, viaturas com defeitos, estrutura de trabalho comprometida e problemas com alimentação. Essa é a realidade da maioria dos municípios do Agreste potiguar, que vêm sofrendo com ataques de bandidos qualificados, com armamento e estratégia que deixam a segurança pública a ver navios. A falta de efetivo é apontado como o ponto que mais compromete a atuação tanto da Polícia Militar quanto da Civil.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE percorreu mais de 300 quilômetros, passando por seis cidades do agreste, para conversar e constatar como andam os órgãos de segurança no interior do estado. E a notícia não é boa. Algumas localidades estão apenas esperando os bandidos agirem, pois não dispõem da mínima capacidade de combatê-los.

E as quadrilhas já estão agindo. Nos últimos três meses, os bandidos estão migrando para o interior justamente por perceber essa deficiência. Foram seis explosões a caixas eletrônicos, nas quais a polícia não pôde oferecer a mínima resistência.

De Pedro Velho, a 70 quilômetros da capital, a Serrinha, a 80 quilômetros de Natal, passando por Montanhas, Santo Antônio e São José de Campestre; existe um consenso: tanto a PM quanto a Polícia Civil necessita de uma reestruturação urgente.

Começamos por Pedro Velho, que tem pouco menos de 15 mil habitantes. Lá, no destacamento da PM funciona um “mini-presídio”, como classificaram os PM’s, com 26 detentos. “Não recebemos nada a mais para tomar conta deles e isso atrapalha a nossa função”, conta um soldado que preferiu não se identificar.

O comandante do destacamento, o tenente Francisco Simão da Silva, também esclarece que os policiais trabalham com coletes balísticos vencidos. “Eles foram fabricados no ano 2000 e tem validade de 6 anos, que obviamente já expirou. Mas mesmo assim nos vemos obrigados a trabalhar dessa forma”, conta o tenente.

Em Pedro Velho, a alimentação da tropa é paga pela Prefeitura, o que seria obrigação do Estado. O comandante afirma que necessita de um aumento de efetivo para realizar com eficácia a segurança. “Contamos com 18 homens ao todo. O ideal seria 30”. A delegacia da Polícia Civil (PC) conta 2 agentes por dia.

Na cidade vizinha Montanhas, a 95 quilômetros de Natal, a situação é pior. Não há agentes da PC e existem apenas dois policiais militares trabalhando por dia em um município de 13 mil habitantes.

As condições dos coletes são as mesmas, vencidos. As armas, revólveres calibre 38, são consideradas ultrapassadas e os policiais trabalham com o armamento adquirido particularmente. O destacamento se resume a uma antiga farmácia com uma mesa, onde também são lavrados boletins de ocorrência – o que seria função da PC. A delegacia aparenta estar com a reforma concluída, mas está com as portas fechadas e placa de “o governo está aqui” situada na frente parece ser uma ironia.

Tanto a alimentação quanto a viatura são asseguradas pela prefeitura local, que paga por ambas. “Se houver uma ocorrência grande, a gente não vai porque não tem estrutura”, relata outro soldado que preferiu não se identificar com medo de represálias pelas críticas.

Para esse soldado, há muito desvio de funções, com policiais servindo a políticos, como também existe escalas desiguais em um mesmo batalhão, o 8º batalhão de Nova Cruz, de onde a maioria dos policiais do agreste são distribuídos.

Onde a situação também preocupa é em São José de Campestre, 110 quilômetros distante da capital. Com uma população de 12 mil habitantes, existem 6 homens em escala de dois por dia para atender a demanda. O comandante do destacamento, o sub-tenente João Maria de Lima, diz que a reportagem não vai encontrar nada diferente do que já encontrou nas cidades que passou.

“O comando chegou a se reunir para nos alertar quanto aos assaltos constantes a caixas eletrônicos. Mas sem uma contrapartida de efetivo e equipamento, não existe condições de combatê-los”, lamenta o comandante, dizendo-se sentir vulnerável com a ação de quadrilhas fortemente armadas.

O sub-tenente constata a realidade a qual passa a segurança do Rio Grande do Norte. “Os bandidos perceberam a fragilidade das cidades interioranas e estão migrando para cá justamente por causa dessa facilidade que eles têm para agir”.

Com menos de 7 mil habitantes, Serrinha a 80 quilômetros de Natal é outro alvo em potencial de bandidos. Lá, trabalham apenas seis homens da polícia militar e não contam com agentes da PC.

A deficiência não é privilégio da PM. Em Santo Antônio do Salto da Onça, a reportagem é convocada para constatar a realidade em que  os dois agentes trabalham na delegacia do município. As reformas do local estão paradas há oito meses e apenas uma das celas tem condições de abrigar presos. A única viatura está quebrada há mais de um mês sem receber sinais de quando será consertada. “A delegacia geral precisa interiorizar as ações para começar a oferecer alguma resistência aos bandidos”, afirmou um agente que terá a identidade preservada.

O reduto de segurança do Agreste é a cidade de Nova Cruz. Com o 8º Batalhão e a delegacia regional, o município é, de longe, o que apresenta mais condições de combater a criminalidade.

PM e PC querem intensificar ações no interior

Procurado pela reportagem da TRIBUNA DO NORTE, o delegado geral da Polícia Civil, Ronaldo Gomes de Morais, disse haver um projeto já pronto para se intensificar a presença da PC nas cidades interioranas. “Há um projeto para nós ocuparmos 40 sedes de comarca no interior do estado. Mas isso depende da nomeação dos aprovados no concurso, coisa que está a cargo da governadora”, esclareceu.

O comandante geral da Polícia Militar no RN, o coronel Francisco Araújo, acenou com melhorias de equipamento e efetivo. “As últimas turmas formadas estão sendo voltadas, na sua maioria, para o interior. Como a última em que dos 472 policiais, apenas 114 foram destinadas a Natal”.

Quantos a deficiências nos equipamentos de trabalho, Araújo respondeu: “Já uma licitação pronta para adquirirmos coletes e armamento. Estamos aguardando a liberação do orçamento, ainda sem data prevista, para podermos fazer isso”.

O coronel fez questão de rebater as críticas feitas devido aos coletes vencidos e aos revólveres, considerados ultrapassados. “O revólver permanece como uma arma potente. Claro que uma pistola é melhor, mas ainda não temos condições de abastecer todo o nosso efetivo com esse tipo de armamento. Quanto aos coletes, essa validade de seis anos não é exata, é relativa. Quando ele permanece em boas condições, não há problemas maiores em utilizá-lo”.

Bancos

Na medida em que a reportagem passava pelas cidades e conversava com os órgãos de segurança pública, também observava o que os bancos ofereciam para manter o patrimônio longe das quadrilhas.

Não é difícil imaginar o porquê de as agências do Banco Bradesco  serem os alvos preferidos das quadrilhas as quais utilizam explosivos. As agências simplesmente não oferecem nenhum tipo de dispositivo ou equipamentos que facilitem a investigação policial após o crime ou que contate automaticamente a PM durante o assalto.

Terminais eletrônicos da empresa representaram cinco das seis explosões registradas no Rio Grande do Norte nos três últimos meses. No estado vizinho, Paraíba, a porcentagem é ainda maior: sete dos sete caixas eletrônicos vítimas de explosivos eram daquela empresa.

Em Montanhas e Serrinha não há câmeras de segurança, sensores de presença nem alarmes que contatem a polícia. Em Pedro Velho, vê-se um sensor de presença que aparenta não servir para muita coisa.

As agências dos Correios, que vinham sendo os alvos, parecem ter perdido o páreo para o Bradesco, na disputa de quem oferece menos segurança ao patrimônio.

Desde novembro, quando aconteceu a primeira explosão no RN, a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado (Sesed) já pedia por uma atitude no sentido de, no mínimo, dar algum subsídio para a investigação policial, como câmeras de segurança.

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